Por João Pedro Ambrosi¹ e Rafael Pereira², direções da Revolução Socialista Regional Paraná
Curitiba é uma cidade de contradições, que vive de aparências que ela mesmo cultiva, iludindo grande parte do povo a achar que toda essa fantasia é real na materialidade do dia a dia da classe trabalhadora. Uma grande mentira contada muitas vezes pode até parecer verdade, mas ela nunca deixa de ser uma mentira, mesmo com muito esforço para convencer do contrário.
A própria esquerda progressista muitas vezes cai nesse erro. Acreditam e lutam por algo, para depois se apropriar de um rótulo e debater farsas, muitas vezes na busca de reformar e maquiar um problema para deixá-lo com outra cara. O debate sobre cidade verde é um dos pontos que trazemos para destrinchar aqui.
Recentemente, foram feitos diversos cortes de árvores pela prefeitura de Curitiba para executar obras (em período eleitoral) e muitas OSCs/ONGs, movimentos sociais e partidos foram para as ruas protestar, lutando para que essas árvores não fossem tocadas. O curioso é que esse movimento, de forma geral, se deu principalmente por moradores de bairros de classe média, lutando para manter seus bairros arborizados. Saíram às ruas e pressionaram o Estado a manter seu local de moradia verde, como sempre foi.
A finalidade das obras, melhorias para uma das linhas de ônibus mais utilizadas por trabalhadores da capital, sequer entrou em debate, um esvaziamento que resume o problema a “não queremos cortar nossas árvores”. Esta é uma pauta climaticamente justa? Sim. Quem reivindica está pensando a questão de forma coletiva e transversal? Infelizmente, acreditamos que não. As direções envolvidas neste processo têm consciência disso? Sem sombra de dúvidas!
Assim, se conserva a aparência da cidade verde onde ela já é verde, os próprios moradores ou protestantes lutam para manter a estrutura verde, direcionando suas energias para manter as aparências que tanto criticamos.
A crítica, aqui, não é contra a defesa de seu território feita pela classe média, mas sim à falta de entendimento de cidade e do direito a ela apresentada nesses casos. Lutamos por todas as árvores ou pelas nossas árvores? A pauta ambiental é integrada ou segmentada?
Estamos em setembro, próximos ao Dia da Árvore e em período eleitoral. Vemos políticos de carreira mobilizarem suas bases para lutar pelo meio ambiente, um debate pequeno-burguês - de playboys - feito em regiões nobres da cidade. Esses partidos de esquerda têm agregado às suas fileiras cada vez mais essa juventude que luta por um planeta sustentável, porém essa juventude é branca e com poder aquisitivo elevado. Algo está errado.
O debate nas áreas fora dos limites da cidade-aparência é outro, porque a crise climática nesses lugares chega com sua pior face. Na periferia, mesmo que quisessem, não há tantas árvores para defender, a luta ambiental ali se dá contra a contaminação dos lixões, contra alagamentos e desbarrancamentos, dentre outros aspectos do racismo ambiental. Para agravar a situação, as regiões fora das zonas nobres estão se tornando ilhas de calor, consequência do aquecimento global, enquanto no Batel a temperatura é amena e agradável graças ao urbanismo direcionado da cidade modelo defendida por uns, no CIC e Sítio Cercado a sensação térmica é muito mais alta, infernal.
Uma política ecossocialista, feita para todas as pessoas que constroem e vivem a metrópole, considera a mobilidade sem ignorar as urgências dos mais impactados. Promove campanhas de conscientização e educação ambiental, mas também debate questões socioeconômicas para que as árvores salvas não estejam somente atrás da janela do ônibus que o trabalhador vê voltando para sua casa.
A falta de planejamento inclusivo, para todas as pessoas é um padrão nas cidades brasileiras e a periferia fica exposta aos riscos ambientais, enquanto as áreas centrais e nobres mantêm sua sombra e água fresca, lutando para garantir o que as aparências lhes garantiram por nascerem onde nasceram.
Rompemos com a indignação seletiva e a cidade das aparências quando olhamos para o problema como um todo, quando saímos debaixo da nossa árvore e vemos que nem o ar puro e a sombra são para todos no capitalismo.
¹ João Pedro Ambrosi, é militante ecossocialista, parte da direção regional Curitiba e membro do comitê central da Revolução Socialista
² Rafael Pereira é designer contra-opressões, militante ecossocialista, membro da direção da Revolução Socialista Paraná e candidato a vereador em Curitiba.
O capitalismo verde destorce e desloca as pautas ambientais do centro do problema! Fiquemos antentes, camaradas!
As direções reformistas se apoiam na ilusão da cidade verde. Ecossocialismo ou barbárie!
Ótimo texto. Traz muito bem a questão do racismo ambiental e abafamento que forças ditas de esquerda realizam sobre esse processo, ainda mais no período eleitoral. Ecossocialismo ou barbárie!